Me vejo fazendo esta pergunta repetidas vezes: o que estão
fazendo com nossas crianças? As discussões com relação a este tema são
inúmeras: desde os casos de abandono “ao pé da letra” até o mais novo golpe. A
lei sancionada há pouco tempo pela presidenta Dilma fala da obrigatoriedade de
matrícula de crianças de 5 anos de idade no ensino fundamental, até o ano de
2016. Não diria que foi o golpe de misericórdia, pois depois de tudo que já vi
e ouvi com relação à infância, infelizmente não me resta outra alternativa a
não ser acreditar que ainda tem mais. Ah, com certeza, o ser humano é capaz de
tal façanha!
A infância está sendo abandonada, aos poucos, através de
atitudes radicais e sem reflexão por parte dos adultos. Elas são abandonadas dentro
de seus próprios lares, pela falta do amor verdadeiro e para fora deles, quando
a família desestruturada não os consegue criar, não os consegue orientar,
educar, amar. São abandonadas quando são agredidas, violentadas, mortas sem
piedade. São abandonadas quando são medicadas para “curar” ou “tratar” males
que o próprio adulto desconhece, mais especificamente a classe médica. Quando
este médico despreparado para os males da alma, o que infelizmente acontece com
a maioria, fala para uma família igualmente despreparada, com medo do que
também desconhece, cansada do próprio fracasso, é claro que encontrará ouvidos
prontos e desesperados por palavras que tranquilizem. Tranquilizam sim, mas
nada passa de uma ilusão. O que o médico diz não alcança a verdadeira causa do
que possa ser um “distúrbio” qualquer. E então, aplica-se a alopatia para poder
“controlar”, mas não para realmente tratar. Assim, estes pais acreditam que
tudo está resolvido. Foi controlado, foi dado um nome e o passo seguinte é o
remédio, dado a uma criança que sequer foi avaliada em toda a sua dimensão, em
toda a sua complexidade. Esta criança não é ouvida, não é observada, não se
olha para ela com os olhos de quem realmente quer ajudar, curar.
A infância está sendo abandonada mais uma vez, quando se
obriga a colocá-la numa escola com as exigências de um ensino fundamental, aos
5 ANOS DE IDADE!! A educação infantil, que ainda hoje se dedica a crianças de 4
e 5 anos, está pedagogicamente estruturada para receber e orientar crianças
desta faixa etária. Isso já existe. Por que, então, a necessidade de mudar isto
e colocá-las tão cedo numa etapa de ensino que não foi planejada para elas?
Como já disse em outra postagem, a criança passa por diferentes etapas de
desenvolvimento cognitivo, motor, emocional, etc, de acordo com sua idade e
isso precisa ser respeitado. Continuam sendo queimadas etapas importantíssimas
para o desenvolvimento sadio de um ser humano e estes serão os adultos que
amanhã estarão por aí, disputando vagas em faculdades, em empresas, procurando
se relacionar com outras pessoas, enfim, procurando viver. Desta forma, estamos
permitindo o desrespeito a estas crianças, em todos os sentidos, crianças que,
num futuro não muito distante, serão adultos repletos de limitações, de
incertezas, de dúvidas, de fracassos como seres humanos. Aliás, fazendo uma
pequena correção, estamos desrespeitando estas crianças que, cada vez mais, não
chegam à adolescência, muito menos à idade adulta, sem precisar de
acompanhamento psicológico.
Nossas crianças sofrem e, enquanto nada for feito,
continuarão sofrendo em suas próprias vidas a responsabilidade sem fim de
precisar satisfazer a demanda dos desejos do mundo dos adultos.
Deixo aqui uma imagem, para mim muito triste, que simboliza
num ato de alguns segundos, o que acontece num âmbito muito maior: no colégio
onde minha filha estuda (colégio que abriga estudantes de uma fatia abastada do
bairro de Alphaville, em Barueri-SP), há uns dias atrás, precisei esperar
alguns minutos para poder trocar umas palavras com uma das coordenadoras.
Aguardei no local onde as crianças são “deixadas” pelos pais, quando não têm
sequer alguns minutos para descer do carro e se despedir. Num determinado
instante, me deparei com a cena que me cortou o coração. Como mãe, imaginei se
fosse minha filha. Que dor.... Desceram dois irmãos de um carro, o maiorzinho
cuidando do outro pequenino, que não devia ter mais de 3 anos. Cada um puxava
sua mochila de rodinhas e foram em direção à rampa de acesso às salas de aula.
A cena termina com o irmão mais velho dizendo: “vamos, vamos...”, segurando
forte a mão do pequenino que acenava sem parar para um pai que já não estava
mais lá e dizia “tchau, papai. Tchau, papai....”
Um abraço a todos!www.cedop.net